Modelo híbrido integra estratégia de atuação da Adel

 

*Por Glaucio Gomes

Diante do cenário de retração das atividades de filantropia no Brasil e no mundo trabalhar com modelos híbridos tem sido a aposta de muitas organizações sociais no Brasil para garantir sua sustentabilidade financeira. A Adel aderiu a esse modelo e alia as estratégias programáticas, sem fins lucrativos e orientadas totalmente para a missão com estratégias de novos negócios, em que as expertises da instituição são tratadas por seu valor agregado e oferecidas a clientes no formato de prestação de serviços de consultoria e assessoria em gestão do desenvolvimento local e gestão de impactos socioambientais em comunidades resilientes.

Criada em 2007 com a ideia de que era possível gerar valor para as atividades técnicas e especializadas para o desenvolvimento local, a Adel começou em 2016 a materializar este desejo quando estabeleceu sua primeira relação de negócio com um cliente para realizar serviços especializados de desenvolvimento local em comunidades no interior do Rio Grande do Norte, no Nordeste brasileiro.

Reconhecendo que uma relação comercial, puramente de negócios, exige um tipo de interação, cobranças e expectativas sobre qualidade e eficiência diferente de uma relação filantrópica, geralmente mais amena ou flexível, a Adel preparou-se para essas oportunidades técnica e administrativamente. Ao tratar de contratos com escala financeira e operacional significativamente maiores e com modelos de gestão, de relacionamento com stakeholders, de administração e de entrega de produtos e resultados específicos é necessário além de atender aos padrões do mercado, satisfazer o cliente a ponto de gerar propaganda espontânea.

Diferencial

E o sucesso dessa empreitada, pelo menos na Adel, tem sido o profissionalismo – o cliente não espera o mesmo que o doador ou que o investidor social. Ele não espera se relacionar com uma ONG, ou ter que se lembrar dessa diferença de tipo institucional – com e sem fins lucrativos. Para o cliente, o que importa é a relação entre custo, benefício e oportunidade. A seriedade, o profissionalismo e as garantias de qualidade e eficiência nas entregas devidas.

Um exemplo da seriedade conferida pela Adel a esse processo de transição para uma organização híbrida foi a criação de uma Diretoria de Negócios – especificamente criada para gerir projetos e contratos relativos a operações comerciais com clientes. Que foi ocupada por Wagner Gomes, empreendedor social da Rede Folha e fellow da Ashoka. Anteriormente, exercia a função de Diretor Executivo da Adel.

Certamente a maior ameaça gerada pela criação de um canal de relacionamento comercial com clientes em uma ONG é à sua consistência geral, sua dedicação e seu foco para sua missão. São vários os casos de organizações que criaram estratégias de negócios e implantaram em sua atuação que, em pouco tempo, se viram em dilemas entre seguir seus valores referentes à missão ou crescer empresarialmente, em sua frente comercial.

A Adel para “fugir” desse dilema deixa claro para si própria, como instituição, quais são os limites de sua atuação comercial e ao respeitar sempre esses limites. A instituição apresentou os serviços que oferecem ao mercado através de seu portfólio e as condições de oferta – ter alinhamento ético e técnico com a missão da instituição e levar em consideração, no desenho e na aplicação da estratégia e da metodologia de implantação seus valores centrais: empreendedorismo, protagonismo, cooperação e juventude. Houve casos, em negociações com clientes, em que negócios não foram fechados porque os desejos do cliente eram contrários a missão institucional.

A atuação negocial é uma estratégia efetiva de sustentabilidade institucional. É apenas uma outra estratégia para gerar impacto, assim como a nossa atuação tradicional – sem fins lucrativos, realizando projetos a partir de doações e investimentos sociais privados. Ambas as frentes trabalham para cumprirmos com nossa missão e respeitando nossos valores. A diferença é a maior flexibilidade na frente comercial para alinhar nossa prática e nossos expertises com as demandas apresentadas por nossos clientes. Enquanto em nossa frente programática nós escolhemos e propomos a parceiros e doadores o modelo e o local de incidência de nossa atuação, de modo discricionário.

O modelo de gestão implantado na instituição também é importante para evitar o dilema do crescimento da atuação comercial sobre as atividades relacionadas a missão. Na Adel os mecanismos de governança das áreas de negócios e programática são totalmente separados e específicos às necessidades e oportunidades de cada uma. Enquanto na área programática, existe uma equipe especializada e dedicada para pensar em projetos de impacto social por uma perspectiva metodológica própria com dinâmicas pedagógicas voltadas para o trabalho com as comunidades e com o território, a área de negócios conta com uma equipe especializada mais móvel, dinâmica e que está preparada para atuar gerindo e operacionalizando serviços em diferentes núcleos, territórios e comunidades, de acordo com as demandas e oportunidades apresentadas pelos clientes – e alinhadas com o portfólio. A própria cultura de relacionamento com esses dois tipos de stakeholders, doadores e clientes, é diferente e exige perfis profissionais distintos.

As áreas programática e de negócios são unidades de gestão separadas. Ambas as equipes interagem entre si, trocam conhecimentos, registram lições que aprendem em campo e em alguns casos se complementam em projetos específicos. Busca-se sempre a eficiência operacional. Em muitos casos, as equipes de uma área prestam serviços internos à outra área, por terem maior expertise em um assunto ou outro demandado em um projeto ou contrato. Mas as premissas que governam ambas as áreas são abertas e declaradamente específicas às suas configurações, para que sejam adequadas ao relacionamento com seus stakeholders chaves.

Tudo isso é possível na Adel porque houve planejamento e uma vocação institucional. A instituição investiu em profissionalização e promove uma cultura organizacional em que o dinamismo é chave para lidar com diferentes faces e formas de interação para cumprir sua missão. Por ser uma organização social de interesse público (OSCIP) todos os resultados financeiros positivos de operação, são investidos em atividades relacionadas à missão. Os saldos positivos das operações de negócios são transferidos para um fundo de manutenção e administração da Adel, que permitem que a estrutura da organização seja mantida para sua atuação na frente programática.

Com um faturamento de cerca de R$ 3 milhões por ano com contratos de negócios, os resultados financeiros positivos dessa operação permitem oferecer importantes contrapartidas institucionais e complementar doações e investimentos sociais privados para desenvolver a área programática e beneficiar, ainda mais jovens rurais, agricultoras e agricultores em comunidades resilientes.

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